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domingo, 9 de dezembro de 2018

Cátaros, os homens bons- Parte I

Quem visita a região de Languedoc-Roussilon, no sul da França, não se cansa de admirar a paisagem cercada de rochas e videiras, as mais antigas da Europa, que orgulha seus habitantes. Incrustadas na estrada sinuosa que corta a região, o viajante encontrará ruínas de castelos em Cobiéres e Ariége que, entre os séculos 11 e 12, serviram de refúgio ao povo cátaro.

Em cidadezinhas como Montaillou, Arques, Peyrepertuse, Quéribus, Aguilar e Minerve, os moradores do Languedoc também não escondem sua admiração pela cultura cátara. Esse orgulho é visível nas pequenas livrarias com uma infinidade de livros sobre o modo de vida e a doutrina daqueles que se autodenominavam “os bons homens” e “as boas mulheres”, fundadores de um cristianismo alternativo que, entre outras coisas, não admitia se submeter à soberania papal e também não aceitava os dogmas da Igreja Católica, como a crença na Santíssima Trindade, por exemplo.

Nas palavras da Igreja Romana do século 12, o catarismo não passava de um movimento herético por não acolher qualquer tipo de domínio religioso ou político, da Santa Madre Igreja. Esta, em contrapartida, não tolerava qualquer interpretação espiritual que não seguisse à risca as instruções vindas de Roma. Por tudo isso, a luta contra os cátaros durou quase oito décadas (de 1167 a 1244), até que sua doutrina deixasse de ser uma ameaça ao poderio da Igreja Católica Apostólica Romana.

O início do movimento
Os cátaros formaram a sociedade secreta mais popular da Idade Média. Os adeptos do movimento eram pacíficos e muito estimados pela população do Languedoc, tendo muitos nobres entre seus seguidores. E não foi à toa que a doutrina cátara foi bem aceita na região. Na Idade Média, a próspera Languedoc era um centro de diversidade cultural onde conviviam em paz normandos, catalães, judeus e sicilianos. Exercido por cidadãos livres que abasteciam os feudos com seus produtos agrícolas, ferramentas, armas e um sem-número de manufaturados, a força do comércio na região também limitava os poderes da nobreza intimamente ligada ao clero.
O início do catarismo é impreciso. Alguns historiadores acreditam que o movimento religioso nasceu em Constantinopla e foi trazido para a Europa Ocidental depois da 2ª Cruzada, por volta de 1147 e 1149. Outros pesquisadores sugerem que as primeiras ideias de um movimento religioso (que ainda não tinha um nome oficial) começaram antes, por volta de 1022, quando dois monges foram injustamente queimados vivos, acusados de satanismo.

O bispo de Toulouse, a maior cidade de Languedoc, foi contra a execução. Mas o que a autoridade eclesiástica escondia dos poderosos da Igreja é que ele se reunia secretamente com outros clérigos para discutir suas ideias pouco ortodoxas e as insatisfações com o catolicismo praticado na época. O grupo acreditava, por exemplo, que Deus era um espírito puro e que a criação do mundo não tinha nada de divino, mas era, sim, o resultado de uma obra perversa, criada pelas forças do mal.

As ideias dos primeiros cátaros que aspiravam a volta do cristianismo primitivo começaram a se espalhar pela Europa. A nova crença arregimentou adeptos na Catalunha (Espanha), na Alemanha, na Inglaterra e na Itália. Seguidores da doutrina cátara recebiam diferentes nomes de acordo com seu país de origem. Dessa maneira, na Itália, eram conhecidos como patarinos, na Alemanha, como ketzers, na Bulgária, como bogomils. Porém, foi na região do Languedoc que os cátaros floresceram e viveram em paz por várias décadas.
 O movimento, entretanto, levou mais de 150 anos para se afastar definitivamente da Igreja oficial. No século 12, mais precisamente em 1167, cátaros franceses se reuniram em uma assembleia no Castelo de Saint-Félix de Caraman, para oficializar o abandono do credo católico em quatro paróquias da região do Languedoc, Toulouse, Carcassone, Albi e Agen, abraçando as novas diretrizes do catarismo. Por causa das paróquias de Albi e Agen, o movimento também foi chamado de albigense. Nessa mesma assembleia, foram nomeados os bispos de cada região e fixados os limites de cada diocese.

Segundo uma das versões históricas, o termo cátaro viria do grego katharoi, que significa “os puros”. Mas a palavra entrou para o vocabulário medieval por volta de 1160, graças a um pregador católico da Renânia chamado Eckbert de Schönau que abominava a nova doutrina. Segundo Alain de Lille, um teólogo francês do século 13, sua origem estaria na palavra catus (“gato” em latim), pois os seguidores da seita, de acordo com Eckbert de Schönau, “faziam coisas ignóbeis em suas reuniões, como beijar o traseiro de gatos”.

A luta do bem contra o mal
Os novos fiéis não davam a mínima atenção para as palavras de Eckbert e continuaram em frente, espalhando sua doutrina e conquistando adeptos. O catarismo foi uma religião influenciada pelo maniqueísmo, doutrina filosófica, fundada pelo profeta persa Mani. O princípio básico da filosofia maniqueísta é a divisão do mundo entre Bom (ou Deus) e o Mal (ou Diabo). Dessa forma, toda matéria é intrinsecamente má e tudo o que é espiritual “nasce” naturalmente bom.
 Conforme as ideias do profeta, a fusão dos dois elementos primordiais, os reinos da luz e das trevas, teriam originado o mundo material. Por sua vez, os cátaros, seguidores do princípio da dualidade, também acreditavam que a criação do mundo e do ser humano era obra do Diabo e que a salvação estava em encontrar o reino da luz.

Fonte: leiturasdahistoria.com.br
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Um comentário:

Elvira Carvalho disse...

Muito interessante. Nunca tinha ouvido falar deste povo, nem deste movimento.
Obrigado pela partilha.
Abraço e bom domingo