A Igreja Universal do Reino de Deus sempre gostou dos mármores, dos
 dourados, da grandiosidade do espetáculo. Quando plantou sua imensa 
catedral no depauperado bairro de Santo Amaro, distrito destroçado pela 
recessão e desindustrialização dos anos 1990, assentou um modelo 
monumental, rico, suntuoso e ostentatório de arquitetura e decoração 
religiosas. Vieram outros tantos colossos, sempre no mesmo padrão. Não 
poderia ser diferente com o maior de todos os templos dessa denominação 
neopentecostal, inaugurado no último dia 31/07,  quinta-feira.
O mítico 
Templo do Rei Salomão, a obra maior do bispo Edir Macedo, custo alegado 
de R$ 680 milhões, contudo, excede em muito o que já se viu. E marca, 
como se verá, um novo momento da igreja, repleto de importantes 
referências judaizantes e de homenagens ao Estado de Israel, entendido 
como o berço bíblico da tradição abrâmica. Denominações evangélicas 
americanas há décadas fazem o mesmo, no que já foi apelidado de “novo 
sionismo cristão”.
Este blog conversou com seis pessoas que 
estiveram presentes na festa de inauguração à qual a imprensa em geral 
não pode comparecer (só os veículos ligados à Universal, como a Rede 
Record de TV, o jornal Folha Universal e a Record News). A seguir, seus 
relatos sobre o que aconteceu lá:
-----------------“O mais legal foi ver que Jesus 
acabou expulso do Templo do Rei Salomão. É muito engraçada a ironia. 
Justo quando inaugurava uma réplica do Templo de Jerusalém, construído 
por Herodes, do qual Jesus teria expulsado os vendilhões da fé, o bispo 
Edir Macedo resolveu expulsar Jesus.”
 ----------------- “Em todas as igrejas do Edir 
Macedo, lê-se o lema da Universal, sempre o mesmo: ‘Jesus Cristo é o 
Senhor’, ‘Jesus Christ is the Lord’ ou ‘Jesucristo es el Señor’. A frase
 encontra-se em destaque nos altares das igrejas do bispo Macedo, seja 
em que país for. Mas não no maior templo. No Templo de Salomão 
reconstruído, a frase foi substituída pela novidade: ‘Santidade ao 
Senhor’. Em lugar das letras góticas de sempre, agora foram usadas 
letras do alfabeto hebraico.”
Mas tem mais, muito mais. Leia o relato completo:
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 “A chegada foi terrível. A avenida Celso Garcia estava congestionada. 
Policiais e marronzinhos da CET tentavam organizar o trânsito. E então, 
ao nos aproximarmos do templo, vimos uma multidão perfilada, todos de 
camisetas brancas, de mãos dadas, formando uma corrente humana em torno 
do quarteirão. Nos mastros, hastearam-se as bandeiras da Igreja 
Universal, a bandeira brasileira e o pavilhão nacional de Israel.”
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 “Já se via ali que o espaço era especial, precioso, protegido. Eu 
estava chegando no meu carro e perguntei para um desses rapazes da 
corrente humana onde devia estacionar. Hã? A gente estava a poucos 
metros da entrada do estacionamento e ele não sabia. Havia uma estrita e
 rigorosa divisão de tarefas entre os seguidores de Edir Macedo. Aqueles
 ali eram apenas para ‘abraçar’ o templo e garantir a segurança do 
espetáculo e dos felizes privilegiados que o assistiriam ao vivo. Não 
falavam; não interagiam.”
----------------- “O Brás, onde fica o 
templo, é um bairro histórico de São Paulo. No começo do século 20, foi 
ocupado por levas de imigrantes pobres italianos, armênios e gregos. 
Então, veio a imigração nordestina, depois da qual sobrevieram os 
coreanos e os muitos bolivianos. É um lugar de trabalhadores muito 
pobres --tudo tem um ar de precariedade, de emendas, consertos. Nas 
centenas de lojas de roupas baratas e de bugigangas, abastecem-se 
camelôs e vendedores ambulantes.”
----------------- “E não vamos 
esquecer da igreja católica, construída em 1908, que fica bem em frente 
do templo, a Paróquia São João Batista do Brás. Minha nossa, aquela 
igreja que por muitas décadas foi considerada uma das mais importantes e
 majestosas da cidade, ficou parecendo cenário de Playmobil.”
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 “Mas, quando se chega àquele quarteirão da Universal, é como se você 
saísse da cidade... Primeiro, tem o sistema de segurança inteiro em 
volta, aquele monte de guardas, a polícia. Então, você entra no lugar 
protegido, onde nada está por acaso, por improviso. Não tem gambiarra. 
Tudo é meticulosamente limpo, planejado e organizado.”
----------------- “Você sai do caos e entra no espaço da ordem.”
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 “Eu fui à abertura do Shopping Paulista e do Shopping Pátio 
Higienópolis. Lembro-me do susto que tomei quando entrei no 
estacionamento do shopping Paulista. Foi um dos primeiros shoppings a 
ter estacionamento sem janelas. Era uma coisa horrorosa. Depois entendi 
que esses lugares que pretendem sequestrar você do mundo real, apartar 
você da realidade, obrigatoriamente suprimem as janelas. Pode ver. Os 
shoppings são assim. Os bingos eram assim. Os cassinos são assim. E o 
Templo do Rei Salomão é assim. Não tem uma janela.”
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 “Não tem mesmo! No estacionamento não tem janelas. Quando entrei, fui 
conduzida a um coquetel no 10º andar, da ala vip. Não tinha janelas. 
Idem para o salão principal, no térreo, imenso, capacidade para 10.000 
pessoas sentadas. Também não tem nenhuma janela.”
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 “Para mim, pareceu um daqueles brinquedos dos parques temáticos de 
diversões, de Orlando, Flórida. O Templo do Rei Salomão, do Universal 
Studios... Bem podia ser. Ahahaha!”
----------------- “Todos os 
meus amigos me perguntaram como eu consegui entrar. Primeiro, chegou ao 
escritório um pergaminho com o convite e um envelope contendo uma senha.
 Daí, era necessário entrar no site para cadastrar o nome e o RG do seu 
convidado. Depois disso, as pessoas do cerimonial ligavam para confirmar
 tudo e só então você recebia um cartão com um código de barras. Era o 
convite individual, pessoal e intransferível, que só seria aceito na 
portaria do evento mediante a apresentação de documento com foto.”
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 “A comissão de recepção funcionava no estacionamento. Checados número 
do cartão, documento, tudo ok, ganhei um pin (brochinho). O meu era da 
cor azul, mas tinha também os vermelhos, e de outras cores. Fotógrafos a
 serviço do evento convidavam os vips para fazer fotos em um estúdio 
portátil, como aqueles da revista ‘Caras’. Detectores de metais impediam
 o convidados de entrar com celular, câmeras ou outros aparelhos 
eletrônicos.”
----------------- “Comecei a achar que havia algo 
estranho quando apareceram pessoas andando com túnicas de seda branca 
até os pés, cintos dourados, sapato social branco, desses de 
enfermeiro... Sei lá, para mim pareceu aquela coisa de novela espírita, 
tipo ‘A Viagem’. Mas depois me explicaram: esses eram os guardiões do 
templo... Estavam lá vestidos como se imagina que se vestiriam os 
levitas, membros de uma das doze tribos judaicas, na época bíblica.”
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 “Lá dentro, um exército de hostesses, mulheres vestidas com longos em 
veludo azul, conduzia os convidados, segundo a cor de seus broches, para
 o andar a eles designado.”
----------------- “O 10º andar, para 
onde fui levado, tinha as paredes forradas por amplos painéis com fotos 
de Jerusalém. O Monte das Oliveiras, o Muro das Lamentações e o casario 
de pedras dentro das muralhas de Jerusalém deram o ar da graça. 
Jornalistas, executivos, atores e apresentadores do staff da TV Record 
brilhavam: Luciano Szafir (com a mãe, Beth Szafir), Paulo Henrique 
Amorim, Celso de Freitas, Heródoto Barbeiro, Marcelo Rezende, Chris 
Flores, Lucinha Lins, Bemvindo Sequeira e o comediante Castrinho. Mas 
também estavam lá vários dirigentes de agências de publicidade. O 
esforçado serviço de bufê incluía itens de comida kasher, servidos em 
uma ala dedicada aos convidados judeus, num dos extremos do salão. Não 
havia bebida alcoólica.”
----------------- “No meio dos 
convidados, em uma mesa, dois homens ainda mais ricamente fantasiados 
agendavam visitas a um museu anexo sobre a história religiosa judaica, 
até chegar à missão do bispo Edir Macedo. Esses tinham, além da túnica 
branca até os pés e do cinturão dourado, uma espécie de elmo dourado, 
imitando ouro, com inscrições em hebraico em que se lia “Servo de Deus”.
 Ah, eles vestiam um peitoral enfeitado com 12 pedras coloridas.”
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 “Por volta das 18h, o pessoal começou a se mexer para descer rumo ao 
térreo, onde fica o grande salão do templo. Nas duas paredes laterais, 
foram colocados 12 candelabros de sete braços, as chamadas menorás, um 
dos símbolos mais conhecidos do judaísmo, representando cada uma das 12 
tribos de Israel.”
----------------- “Os recepcionistas dentro do templo vestiam aquela fantasia dos levitas. Havia também Edir Macedo ao lado de Dilma (Divulgação)mulheres
 entre eles. Eram centenas. Todos –homens e mulheres— invariavelmente 
com mais de 1,70 metro de altura. As mulheres, cabelos compridos, 
prendiam-nos em um rabo-de-cavalo por uma fivela dourada. Eram esses 
personagens que levavam os convidados até o local onde deveriam se 
sentar. Nas fileiras da frente, autoridades portadoras dos broches 
vermelhos. Logo atrás, os convidados vips, portadores dos broches azuis,
 e por aí vai.”
----------------- “Um conjunto de câmara tocava 
canções religiosas judaicas, músicas de trilhas sonoras de filmes 
evocativos da saga judaica, como o hollywoodiano ‘Êxodus’, além de peças
 populares, como ‘Halelluya la'olam’ (‘Aleluia para o Mundo”) e 
‘Yerushalayim Shel Zahav’ (‘Jerusalém de Ouro’, em hebraico), uma 
espécie de segundo hino nacional de Israel.”
----------------- “Então, foi chegando, aos poucos, o poder da 
República: o ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD), o atual, Fernando Haddad
 (PT), o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), o presidente 
do STF, Ricardo Lewandowski, o ministro do STF Marco Aurélio Mello, o 
ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, o ministro-chefe da 
Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, o vereador por São 
Paulo Andrea Matarazzo (PSDB), o vice-presidente da República, Michel 
Temer (PMDB). Por fim aterrissou, na cadeira mais central e mais perto 
do palco, ela, a própria presidente Dilma Rousseff (PT). Foi ao lado de 
Dilma que o bispo Edir Macedo escolheu sentar-se.”

 
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 “Um bispo da igreja apareceu para fazer as vezes de mestre de 
cerimônias. Parecia um rabino. Barbudo, cobria a cabeça com uma quipá 
(solidéu judaico) e vestia o talit, acessório religioso judaico na forma
 de um xale, usado como uma cobertura na hora das preces. Para surpresa 
geral, logo depois de anunciar os presentes, esse bispo-rabino pediu 
silêncio para a execução dos hinos... De Israel e do Brasil.”
-----------------“Duas
 fileiras de cadeiras, ocupadas por uma delegação de 20 membros da 
comunidade judaica, cantaram o hino de Israel acompanhando o conjunto de
 câmara e depois se congratularam, rindo, satisfeitos, pela homenagem.”
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 “Na avenida Celso Garcia, seis homens com a fantasia de levitas, 
apareceram carregando uma réplica do que seria a Arca da Aliança (onde 
teriam sido guardadas as Tábulas da Lei que Moisés recebeu de Deus, um 
pote com o maná que Deus mandou para alimentar os judeus durante a 
travessia do deserto e o cajado de Arão, que tinha florescido). Eles, 
então, começaram a marchar rumo ao templo e nele entraram, pisando em um
 tapete vermelho, até desaparecerem, debaixo do palco. Todo o percurso 
foi transmitido em dois telões de ultra-alta definição.”
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 “Os fiéis da Universal choravam, emocionados. Nesta hora, a cortina de 
tule que recobria o altar se abriu, revelando uma outra réplica da Arca 
da Aliança, desta vez em tamanho monumental e o letreiro: ‘Santidade ao 
Senhor’ (no lugar onde sempre esteva o “Jesus Cristo é o Senhor”).
-----------------“Um
 bispo que se disse ex-viciado em crack, maconha, cocaína, ecstasy, 
prostituição, álcool ‘e tudo o que há de ruim nesta vida’ foi chamado ao
 altar para testemunhar como a Universal ajudou-o a superar a 
dependência. Disse que a ciência, os médicos, os psiquiatras, a 
psicologia, ‘não curam o vício’, que na verdade não passa de uma 
manifestação do demônio. Disse mais: que a cura só vem com a fé. Em 
seguida, pediu aos pastores que já foram ‘viciados’ que se levantassem 
de suas cadeiras. Centenas de homens, todos de terno e gravata, 
levantaram-se e ficaram imóveis, como testemunho do milagre.”
 -----------------“Em seguida veio um breve documentário com a luta do 
povo judeu pela Terra Prometida, que chegou até os dias atuais, com a 
trajetória do bispo Edir Macedo.
-----------------“Foi a senha 
para que ele mesmo subisse ao altar. Sobre o terno que usava enquanto 
esteve sentado ao lado da presidente Dilma, Macedo, agora barbudo como 
um judeu ultra-ortodoxo, também vestiu o talit. Na cabeça, colocou a 
quipá... Antes de subir ao altar, ele ajoelhou-se e beijou o solo, como 
fazem os cohanim, descendentes da casta sacerdotal mais pura na tradição
 judaica.
 ----------------“Então, não poderia faltar... Macedo convidou todos a 
pegar os envelopes colocados no encosto das cadeiras. ‘Estarão abertos 
os Meus olhos e atentos os Meus ouvidos a toda oração que se fizer neste
 lugar.’, disse. E conclamou: ‘Escreva o seu pedido de oração para 
colocar nas pedras do altar! Quem quiser, não é obrigatório, pode fazer 
uma doação’.
-----------------“Não se sabe de onde eles 
apareceram. Mas, enquanto os fiéis iam disciplinadamente depositar o 
pedido nas pedras do altar, dezenas de homens munidos de máquinas de 
cartões de débito e crédito circulavam no meio, recolhendo as doações.
-----------------“Dilma,
 Alckmin e os demais dignitários da República, ali presentes, assistiram
 a tudo sentadinhos. Ao fim de sua peroração, fiéis em êxtase, Edir 
Macedo disse que acompanharia ‘a presidenta’ até uma sala, onde fariam 
uma ‘conferência’."
O templo estava inaugurado.
Fonte: yahoo notícias (blog da Laura Capriglione)