Quando fui selecionado para trabalhar no meio do chamado “lixo social”, imaginei, á princípio, estar adentrando num mundo contaminado e com poucas perspectivas de mudanças. Os noticiários mostram-nos que o Sistema Penitenciário está intimamente associado à idéia de perigo constante e isso, mesmo que inconscientemente, acaba gerando perspectivas pessimistas em quem nunca participou daquela realidade intramuro (dentro da prisão).
Exerço função burocrática dentro de um Estabelecimento Prisional dos regimes aberto e semi-aberto, auxiliando, não raras vezes, na aplicação da Justiça, lidando com direitos e deveres de condenados. Durante o meu curso de formação para Agente Penitenciário Administrativo aprendi que, teoricamente, a função da pena, ao contrário do que eu anteriormente pensava, não se restringe à tão somente punir o indivíduo. O Estado, como executor da sanção imposta pelo Juiz, também deve tentar oferecer ao apenado alternativas de ressocialização, sendo esta a grande questão ou contradição que exige neste instante sério debate.
São muitos os que duvidam irredutivelmente que a recuperação de um criminoso é possível e vêem na ressocialização apenas uma possibilidade utópica. Quanto a isso, quero interpor a minha modesta autoridade de co-participante diário desse drama social.
Logo que fui contratado, apreensivo e talvez influenciado por um certo preconceito, procurei descobrir uma maneira toda especial para lidar com todos aqueles condenados, porém, havia ignorado um fator primordial e que hoje pra mim se faz tão evidente: Eles são pessoas. Traem, mentem, sofrem, tentam, caem, levantam-se. Duvidar de suas vitórias é duvidar do ser humano em geral e aceitar que as coisas realmente não têm mais jeito.
A punição e o castigo fazem-se necessários em algumas situações, mas não deve a sociedade contentar-se em jogar o seu estorvo na prisão e simplesmente exigir que ele lá permaneça. A menos que acreditemos na adoção da pena de morte ou em massacres como o de Carandiru para extirpar a delinqüência, faz-se necessário um novo olhar sobre o trabalho desenvolvido pelo Estado dentro de seus Estabelecimentos Prisionais. Certamente não será o Poder Público quem conseguirá resolver sozinho o complexo problema da criminalidade, mas seria um grande avanço vermos os Servidores Penitenciários identificados com os objetivos da pena, preocupados com a SEGURANÇA, mas não menos com a JUSTIÇA. A seriedade no desempenho da função pública é o ponto de partida para toda e qualquer tentativa de contornar o evidente problema carcerário no país. De nada valerão a construção de novos presídios ou albergues que sirvam tão somente como depósitos de lixo.