Um dos livros apócrifos mais fascinantes
é sem dúvida o livro de I Enoque (ou Enoque
etíope), geralmente datado para o século II a.C. Este livro
foi redigido originalmente em aramaico, mas a única versão disponível hoje está
em etíope. Escrito em
linguagem
apocalíptica, entre 170 e 64 a.C., o livro carrega algumas semelhanças
com o Apocalipse
de João, cuja composição se deu mais de dois séculos depois. Abaixo
um trecho do livro que descreve o nascimento de Noé:
Depois de alguns dias, meu
filho Matusalém escolheu uma mulher para seu filho Lamech; ela engravidou e deu
à luz um menino. O seu corpo era branco como a neve e vermelho como uma rosa,
os cabelos da sua cabeça eram como a lã e os seus olhos como os raios do sol.
Quando abriu os olhos encheu a casa de luz como o sol, e toda ela ficou muito
iluminada (I En 106,1).
Outra parte bastante interessante do
livro são os capítulos 6 a 16, que narram
a queda
dos anjos após desobedecerem a Deus acasalando-se com as mulheres
humanas. Tudo começa com Semjaza, um anjo
disposto a pagar o preço por sua desobediência. Ele relata seu desejo aos
demais anjos, que decidem segui-lo no plano. Semjasa é acompanhado por mais
dezoito anjos, que por sua vez chefiam, cada um, outros dez. Após levarem a
cabo o plano, problemas inusitados começam a surgir:
Elas [as mulheres humanas]
engravidaram e deram à luz a gigantes de 3.000 côvados de altura. Estes
consumiram todas as provisões de alimentos dos demais homens. E quando as
pessoas nada mais tinham para dar-lhes os gigantes voltaram-se contra elas e
começaram a devorá-las (I En 6,2).
Mas os problemas não param por aí. Os
anjos rebeldes transmitem seus conhecimentos aos homens, tais como a astrologia, a metalurgia, a ciência
da confecção
de cosméticos, as fases da lua, a feitiçaria, etc. Tais
conhecimentos causam muitas guerras e o homem chega perto da aniquilação.
Após ouvirem o clamor dos homens e virem
todas as desgraças causadas pelos anjos rebeldes, Miguel, Uriel, Rafael e Gabriel relatam o
problema ao “Senhor dos mundos”, que decide purificar a terra com um dilúvio e
punir os anjos perversos lançando-os num abismo de fogo.
O livro é fruto de uma tentativa de
preencher uma lacuna existente no capítulo seis do livro do Gênesis:
“viram os filhos de Deus
(hb. bney haelohim) que as filhas dos homens eram formosas; e tomaram
para si mulheres de todas as que escolheram” (Gn 6,2).
No relato do livro de Enoque os bney
haelohim (filhos de Deus) são os anjos e a decisão de Deus de destruir a
terra (Gn 6,7) é provocada por esse episódio.
Resquícios da história contada neste
livro são percebidos na epístola de Judas (Jd 14, s).
Fonte: numinosumteologia.blogspot
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