Maria Madalena foi a primeira testemunha da Ressurreição, líder, amiga e a grande Apóstola dos Apóstolos. Em 22 de julho, celebra-se a Festa de Maria Madalena, apontada por teólogas, como Christine Schenke, como a mulher mais desprezada e mistificada da história cristã. As contradições do patriarcado fazem a história de Maria, que vem de Magdala em busca de libertação, se conectar à história de todas as mulheres.
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Embora Madalena não tenha escrito cartas como Paulo de Tarso, ela aparece citada em escritos com um amplo protagonismo na Missão dos apóstolos, como destaca a teóloga e parteira Christine Schenke: “Escritos cristãos extracanônicos antigos mostram comunidades de fé inteiras crescendo em torno do ministério de Maria de Magdala, nos quais ela é retratada como alguém que compreende a mensagem de Jesus melhor do que Pedro e os discípulos homens”.
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Essa deturpação da figura de Madalena é também um reverso da relação de Jesus com as mulheres. “O círculo de mulheres que o acompanhavam e lhe prestavam assistência com suas doações pecuniárias – não só Maria de Magdala, mas também Joana, mulher de Cuza – parecem ter o papel de se encarregarem da intendência, o que teria feito com que a existência do movimento de Jesus fosse possível graças às mulheres”, destaca o biblista Régis Burnet.
Embora durante séculos as interpretações acerca de Madalena tenham mudado e sido utilizadas para julgar o papel da mulher na Igreja, Schenke afirma que os registros são incontestáveis: “Maria de Magdala é uma importante mulher líder e testemunha das primeiras igrejas cristãs”.
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"A justa iniciativa do Papa Francisco de elevá-la ao status de apóstola é uma leitura sensível e coerente do papel dessa personagem, registrado pelo Evangelho. É uma atitude histórica de reconhecimento da figura de Magdalena, não como prostituta, mas como parte integral e fundamental da comunidade dos discípulos de Jesus e protótipo de liberação para os coletivos femininos, que estão dentro e fora da Igreja Católica", escreve Jose Cristiano Bento dos Santos, padre, filósofo e teólogo.
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Esta festa foi proclamada pelo Papa em 2016. Para Francisco, a memoria de Magdalena deve ser celebrada como a primeira testemunha da ressurreição, a apóstola dos apóstolos. Ela é parte essencial da jornada do mestre Jesus, escolhida para ser testemunha d'Ele, por isso ela vai e anuncia aos discípulos: " Eu vi o Senhor" (...) E contou o que Jesus tinha dito" (Jo 20,16-18)
À partir dos últimos anos do século passado, as principais cidades brasileiras assistiram ao despertar da consciência das camadas mais humildes da sociedade. Inferiorizados até 1888 pela existência da escravidão, os trabalhadores livres da era republicana começaram a disputar um lugar na sociedade, o que, no campo do lazer, se evidenciou por uma crescente participação na festa do carnaval, transformada pela classe média numa imitação da brincadeira européia, á base de desfiles de carros alegóricos, corsos e batalhas de flores. Os integrantes dessas populações predominantemente negras e mestiças mais integradas na estrutura econômica das cidades, como os empregados de fábricas e pequenos burocratas, organizavam-se principalmente no Rio de Janeiro em sociedades recreativas denominadas ranchos, e passaram a sair no carnaval produzindo um tipo de música orquestral que acabaria fazendo nascer as marchas de rancho e, em decorrência delas, as marchas ranchos.
Os mais pobres, porém, onde a cor negra predominava (era o mestiço que invariavelmente galgava os primeiros degraus da escala social), continuaram a exercitar-se nos seus batuques e rodas de pernadas ou de capoeira (nome preferido na Bahia). Essa parte da população não saía no carnaval de forma organizada, mas em cordões desordenados, cujos desfiles terminavam quase sempre numa esfuziante coreografia de rabos-de arraia e em coloridas cenas de sangue.
No entanto, ia ser da música à base de percussão produzida por esses negros com o nome de batucada que ia nascer o gênero popular mais nacionalmente representativo da música brasileira: o samba. Três dos mais velhos representantes desse fase seriam Caninha, João da Baiana e Donga, dos quais os dois últimos ainda chegam à década de 70 do século XX, não apenas como sobreviventes de uma era extinta, mas continuando a demonstrar a validade da sua arte em espetáculos evocativamente denominados da "velha guarda".
O mais antigo, José Luís de Morais, o Caninha (1883-1961), chamado em criança de Caninha Doce (porque vendia roletes de cana na zona da estão da Estrada de Ferro Central do Brasil, no Rio de Janeiro), aprendeu a música dos negros durante as batucadas realizadas durante a Festa da Penha. E, em 1932, quando esse população de descendentes de escravos foi obrigada a morar em casebres no alto dos morros do Rio de Janeiro, compôs o samba que valia po uma aula de história da música popular: "Samba do morro/Não é samba, é batucada/ É batucada/ É batucada.../ Cá na cidade/ A escola é diferente/ Só tira samba/ Malandro que tem patente".
De fato, quando Donga, o mais nôvo desses três pioneiros, realiza em 1917, sob o nome de samba, o arranjo de motivos populares que intitulou Pelo telefone, sua primeira providência é registrar música e letra na Biblioteca Nacional, o que equivalia mesmo a tirar patente. A atitude de Donga (Ernesto dos Santos, Rio de Janeiro, 1891) significava que, coincidindo como o aparecimento do samba, a música popular, como criação destinada ao entretenimento da massa, tinha atingido o estágio de produto comercial capaz de ser vendido e de gerar lucros. O crescimento da indústria do disco, e logo o aparecimento do rádio, seguidos mais tarde do cinema e da televisão, provaram que Donga tinha sido um pioneiro esperto ao correr à repartição oficial para "tirar patente".
Mas o exemplo de vida do mais velho sobrevivente da geração que criou o samba a partir da batucada, João Machado Guedes (chamado João da Baiana por que era filho da baiana Perciliana de Santo Amaro), veio mostrar que essa esperteza ia valer para todos, menos para os que criaram o próprio samba.
Donga, com oitenta anos, viveu os seus últimos anos de vida como funcionário aposentado da Justiça, doente e quase cego num subúrbio do Rio de Janeiro. João da Baiana, com 85, acabou por ser recolhido à Casa dos artistas de Jacarepaguá, na zona rural carioca, passando seus últimos dias de uma forma não muito diferente daquela que descreveu com bom humor em seu samba de maior sucesso, o Cabide de molambo, de 1932:
"Mas hoje eu ando
com o sapato furado..."
Fonte: Coleção História da Música Popular Brasileira- Editora Abril